Ele juntou as economias. Todas elas. Depois de anos de trabalho, encontrou uma maneira inesquecível de gastar a grana. Gastar não, investir! Investimento que não se vê muito por aí. Investimento em memórias, em história para os amigos, depois filhos, netos. História para os invejosos. Era a entrada do sonhado carro, preto, zero Km, com aquelo cheiro de novo que iria embora um dia. E porque o cheiro iria embora um dia, ele preferiu investir no sonho.

Perguntou para si mesmo se fazia a coisa certa. Perguntou para os outros. Recebeu incentivo. Beleza, eu vou! Recebeu críticas. É inveja! Era mesmo, mas quais são os argumentos, já que a fraqueza não vai ser admitida?

Bom, vamos lá:

- É muito dinheiro.
- É uma viagem muuuuito longa. Vai cansar.
- E se um macaco à venda naquelas feiras te atacar? Ou pior, uma daquelas cobras?
- E o seu carro novo?
- É muito dinheiro mesmo.
- Vai dizer o quê no trabalho?
- It´s a lot of money.

E o mais importante:

- E se for derrotado?

Foi por isso que ele foi. Ele esteve no Horto quando o caminho até lá foi sedimentado. Deu sorte. Não poderia abandonar o time. E abandono é a palavra certa. Se não tivesse condições, tudo bem, aí é "estamos contigo", mesmo que de longe. Mas, se existe a possibilidade, dane-se o o dinheiro. A viagem longa é o tempo para revisar todas as superstições, para não esquecer de nenhuma. Se o macaco vier, tira uma foto. O carro... que carro? E o pessoal do trabalho vai entender. Vai ter que entender.

Agora que ele chegou, não pode perder.

O bravo torcedor atleticano investiu em sonho. Os milhares de quilômetros que separam o que o olho viu no Marrocos das histórias que a memória vai revisitar valem o esforço. A derrota veio bem antes do esperado, mas não tira a vitória pessoal.

A paixão do torcedor merece respeito. Esse amor pelo time não é de fácil explicação, mas é fácil de mensurar se imaginarmos a vida sem isso. A enorme diferença, a falta de tempero que a vida teria prova que é bom aproveitar. Fazer loucuras como se faz em um amor qualquer (não em qualquer amor, tem diferença). Lá no final, não vai ser do carro que ele vai lembrar, é dos amores, é das decisões corajosas.

Parabéns pela coragem de optar pelo incerto caminho dos sonhos. Parabéns por tomar a decisão certa.

Afinal, carro tem todo dia na concessionária. Dinheiro dá para ganhar de novo, sempre. Mundial é mais difícil.

E na próxima vez ele já sabe o que vai fazer. De novo.

Ricardo Vieira